Por: Aline
Almeida
Ninguém
sabe ao certo como surgiu o movimento da "sopão comunitário"
no Brasil, mas em Santa Rita do Araguaia surgiu em 1990 com a
distribuição de sopa para moradores de rua e doentes. A ideia
partiu da escrivam Raquel Borges Alves de 52 anos, que sempre se
comoveu com os menos favorecidos. Quando não servia sopa, o cardápio
era pão com carne moída e "Kisuki". O projeto durou
quatro anos, e só parou porque que Raquel teve filhos e não
conseguiu conciliar a maternidade com a sopa. O projeto voltou há
cerca de 8 meses por ideia da voluntária Jussara Schmidt Monteiro,
que ao ver a necessidade da comunidade se sentiu tocada e procurou
Raquel por já ter feito o projeto antes.
Fachada do Centro Espirito Maria Nazaré. Foto: Monique Esposito |
Voluntária
desde que o projeto retornou esse ano, Eunice acredita que o
voluntarismo é um forma de fazer bem. “Eu não me sinto obrigada e
acho que todos veem porque querem”, afirma ela.
No
início, a divulgação pedindo ajuda da comunidade ocorreu na rádio,
grupos de whatsapp e principalmente no boca a boca, gerando
colaboradores fiéis.
Nicinha no preparo da Sopa. Foto: Monique Esposito. |
A
rota geralmente e a mesma. Primeiro os voluntários passam nas praças
das cidades para ver se encontram algum desabrigado, depois seguem
para as casas em que os moradores dormem cedo, por fim vão na casa
dos que acompanha a novelas das 9.
Domingos
Rodrigues da Silva, pai de 7 filhos, e um dos beneficiados com a
sopa. Desempregado faz "bicos" de serviços gerais para
garantir o sustento de sua família, porém isso não e suficiente.
Há cerca de 5 meses, ele recebe a sopa todas as sextas-feiras, junto
de uma sacola de verduras, e uma cesta básica mensal do Cras (Centro
de Referência de Assistência Social).
Casa de Domingos. Foto: Monique Esposito |
“Eles
me dão 5 quilos de arroz, um pacote de açúcar, um feijão, um
óleo, um sal e um frango”, conta ele. A sopa e esperada
ansiosamente pela criançada na casa de Domingos. “Agorinha eles
matão ela”, declara o pai.
Apóscada entrega, era feita uma oração com a participação de todos.
As vezes que puxava a oração era um membro do movimento, outras um
morador. Nem as crianças ficavam de fora dessa. Na casa de Domingos,
as crianças colocaram até o cachorro para participar da oração.
Durante
o nosso trajeto, Raquel conta diversas histórias sobre as peripécias
que ocorreram na entrega da sopa. Entre elas, a que mais chamou a
atenção, foi a de um viajante que estava dormindo nas praças da
cidade de alto Araguaia. O senhor de idade avançada, foi abordado
pelo grupo para receber a sopa. Em meio a conversa, ele revelou que
estava recém-operado. Todos ficaram preocupados com a saúde do
homem, já que o mesmo corria grande risco de pegar uma infecção
devido a situação insalubre em que se encontrava. Todos começaram
a ligar para suas respectivas redes de contatos, a fim de tirar o
homem daquela situação. Após alguns telefonemas estava tudo
resolvido. O senhor teria roupas, comida e um leito no Hospital
Municipal de Alto Araguaia, mas para isso deveria abandonar seu litro
de pinga. Quando o homem soube da troca que iria ter de fazer, logo
abraçou a garrafa, sentou no chão, cruzou as pernas e disse: “-
Assim eu não vou”. Depois de alguns minutos de risada, o grupo
usou todos os argumentos possíveis para convencer o senhor que no
momento mais parecia uma criança mimada. Vencidos pelo cansaço, o
grupo providenciou alimento e cobertores com o intuito de voltar no
dia seguinte para tentar novamente convencer o idoso e ajudá-lo a
retornar a sua morada. Mas quando voltaram, o homem já havia partido
sem deixar rastros.
Depois
de uma caminhada de mais de 1 hora das nossas casas até o centro
espírita,
eu e a estudante do 3° semestre de jornalismo, Monique Esposito (21)
que foi me auxiliar nas imagens, ajudamos no preparo da sopa
descascando os alimentos. Depois de pronta a experimentamos. Estava
uma delicia bem temperada e suculenta! Repetimos a cambucá (risos).
Quando terminamos a degustação da sopa fomos a entrega com os
demais voluntários. A princípio entregamos nas praças onde
encontramos moradores de rua, depois passamos a distribuir nas casas.
Algo que gostamos muito foi a forma com as pessoas recebem o
alimento. Elas já vem com uma panela ou vasilha na mão, os
voluntários
colocam a sopa, e chamam todos que residem na casa (inclusive as
crianças) para uma oração. O voluntário e
zootecnista
Breno Augusto
de Oliveira de 42 anos,
diz que “essa
sopa não alimenta só o corpo físico, alimenta nossas almas”.
Tudo é feito com muito carinho, podendo ser sentindo e visto no
olhar de cada um, a alegria e orgulho de estar ali. A distribuição
da sopa terminou por volta das 23 hrs, voltamos para casa com a
sensação de dever cumprido. Tomei um banho e quando me deitei
fiquei pensado, “como
tem gente que tem tão pouco e ainda consegue ser grata, enquanto
outros tem tudo e só sabem reclamar?”,
mas logo
me
lembrei do que Monique havia me falado mais cedo. “O
trabalho voluntário é uma forma de ajudar a quem precisa e a nós
mesmos. É uma sensação maravilhosa de dever cumprido e de estar
fazendo o bem. Saber que existem pessoas boas no mundo em prol do bem
maior, mesmo com a correria do cotidiano, param para pensar e
escultar o próximo e algo maravilhoso”, afirmou
a estudante.
Foto: Monique Esposito |
Por
enquanto, o grupo almeja aumentar o número de famílias
beneficiadas, podendo levar “o alimento do corpo e da alma”, como
eles dizem, a mais pessoas.
Além
da sopa, o grupo realiza todos os sábados encontros com café da
manhã e almoço para as crianças que queiram participar da
evangelização, e de forma não periódica bazares com o intuito
reverter o dinheiro para ajudar o próximo; doação de roupas e
doação de passagens para andarilhos;
Realidade dos moradores de rua no Brasil
De
acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
em 2012 o número de moradores de rua chegavam a 1,8 mi em todo o
território brasileiro, o que representa cerca de 1% da população.
Esse número apresenta um crescimento de 10% nas pessoas que se
encontram nesta situação. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea), a maior parte dessa população se encontra nos
grandes centros, sendo 40,1% nos municípios com mais de 900 milabitantes e 77,02% nas cidades com mais de 100 mil. Já nos
municípios de ate 10 mil moradores a porcentagem era de 6,63%. De
acordo com a Secretaria de Estado de Assistência Social (Setas),
Mato Grosso tem quase mil pessoas em situação de rua, sendo 71% em
Cuiabá e Rondonópolis. Desse total 542 recebem Bolsa Família.
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